A crise econômica levou a uma alta taxa de desemprego e
gerou uma grave recessão econômica no país. Após a retomada do controle da
inflação pelo Banco Central, passamos a conviver com taxas de inflação bastante
baixas e previsíveis. Porém, os reajustes anuais dos planos de saúde – para
aqueles que conseguiram manter os pagamentos em dia – têm sido muito superior
às taxas de inflação. A variedade e a imprevisibilidade dos reajustes dos
planos de saúde gerou uma ampla discussão acerca da abusividade destes reajustes.
Mas, quando é possível considerar que o reajuste é abusivo?
Em primeiro lugar, é preciso considerar que existem 3 tipos
de plano de saúde negociados no mercado: planos individuais, coletivos por
adesão e empresariais.
No caso dos planos individuais, o reajuste anual é
controlado e autorizado pela ANS. No ano de 2018, a ANS autorizou o reajuste de
10%. O IDEC ingressou com ação judicial questionando o reajuste e este foi
reduzido por liminar para 5,78%. O Tribunal Regional Federal da 3ª. Região,
porém, cassou a liminar e o reajuste de 10% voltou a valer para todos os planos
individuais.
A ação judicial do IDEC baseou-se em relatório do TCU que
questiona a metodologia de cálculo utilizada pela ANS para definição do índice
de reajuste anual.
Os planos coletivos por adesão e os planos empresariais têm
reajuste “livremente” negociado e definido pelas partes. Em tese, é isto que
deveria ocorrer. Na prática, há imposição do reajuste pelas operadoras de
planos de saúde com base em cláusulas contratuais.
Novamente, há dois mundos distintos que precisam ser
analisados.
No caso dos planos empresariais, há cláusula contratual que
define a fórmula de cálculo do reajuste. Porém, os contratos são usualmente
celebrados por prazo determinado e a operadora do plano de saúde costuma
reservar-se o direito de resilir o contrato caso a sinistralidade ultrapasse
determinado percentual fixado em contrato. Em outras palavras, se o contrato se
mostra demasiadamente oneroso para a operadora, esta simplesmente rescinde o
contrato ou então aplica um índice de reajuste muito elevado, o que inviabiliza
a manutenção do plano de saúde levando o contratante a não renovar o contrato.
Quando o reajuste é aceito pela parte contratante,
normalmente é muito superior ao índice aplicável aos planos individuais.
A ANS sustenta que, nos planos empresariais, deve vigorar a
regra da livre negociação, pois as empresas teriam – supostamente – uma força
de negociação muito maior do que indivíduos com planos individuais. A realidade
revelou que tal assertiva é uma falácia, pois muitas pequenas e médias empresas
não têm qualquer poder de negociação com as operadoras de planos de saúde.
Por fim, há os planos coletivos por adesão. Estes planos são
oferecidos pelas operadoras de planos de saúde para determinadas categorias
profissionais liberais ou associados de entidades de classe. O contrato é
celebrado por uma administradora de benefícios diretamente com as operadoras e
então os beneficiários finais aderem ao contrato. O fato de existir uma
intermediadora leva a uma situação que deveria ser benéfica aos usuários,
porém, novamente o mundo ideal revelou-se distante do mundo real.
As administradoras de benefícios têm sua remuneração oriunda
da gestão dos contratos, ou seja, o valor da mensalidade é superior a planos
individuais onde não há intermediação. A administradora de benefícios deveria
negociar e agir em favor dos consumidores (beneficiários dos planos) e tentar
reduzir os valores dos reajustes. Porém, os planos coletivos por adesão têm
sofrido reajustes muito superiores aos planos empresariais e individuais.
A lógica de mercado, no caso dos planos coletivos por
adesão, gera bons resultados para as operadoras de planos de saúde e para as
administradoras de benefícios, em detrimento dos consumidores.
Pois bem, todos os planos de saúde são regidos por
contratos. Os contratos têm uma cláusula de cálculo de reajuste anual, que
considera a inflação médica, a variação dos custos hospitalares, a inclusão de
cobertura de novos procedimentos e a sinistralidade.
Há ilegalidade nesta cláusula?
A resposta é negativa. Os Tribunais têm se manifestado no
sentido de que a cláusula é válida e legal, mesmo quando considera a
sinistralidade.
Porém, há limitações e caso estes limites sejam
ultrapassados, haverá abusividade do reajuste. O abuso é detectado quando os limites
são excedidos.
Os tribunais entendem que é possível substituir o índice de
reajuste contratual pelo índice autorizado pela ANS para os planos individuais
de forma excepcional. Nestes casos, decisões judiciais determinam que seja
substituído o índice contratual dos planos coletivos e empresariais pelo índice
dos contratos individuais.
A questão é fática e depende de prova. Prova que muitas
vezes as operadoras de planos de saúde não fazem. É preciso demonstrar que o
reajuste atende aos requisitos contratuais, e caso a prova não seja feita, a
revisão da cláusula contratual é julgada procedente e declarado o reajuste como
abusivo.
Pode-se tomar como regra geral e simplificada que se o
reajuste anual aplicado for superior a 75% do índice de reajuste da ANS, então teremos
uma situação de abusividade. Repita-se, porém, que a discussão durante o
processo dependerá de prova, inclusive de natureza pericial.
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